Quem vai a Ouro Preto se impressiona definitivamente com as sombras concretas do passado brasileiro há alguns séculos de distância, conservado em monumento histórico feito de uma cidade inteira.
Não é como outros lugares, em que a história é vista aqui e ali a conta-gotas, não, em Ouro Preto você caminha, respira, habita dentro da história. Os casarões, as igrejas e os muros projetam as sombras do passado e o viajante navega entre essas projeções como se tivesse realmente voltado no tempo da história, mais precisamente ao Século XVIII.
Curiosamente é também uma cidade de muita juventude: cheia de estudantes morando nos casarões transformados em repúblicas há décadas. Essas moradias estudantis são mantidas por confrarias tradicionalíssimas formadas pelos eternos e fiéis ex-estudantes que recepcionam os novos a cada ano. Isso mantém a cidade em constante clima de festa e irreverência.
Ouro Preto, além de ser uma cidade, também pode ser considerada um poema em forma de casarões, igrejas e ladeiras. Um poema que é cantado por tantos poetas desde que o lugar existe, desde Tomás Antônio Gonzaga passando por Cecília Meireles, Vinícius de Moraes e tantos outros, famosos ou anônimos.
Em 1950 o poeta Murilo Mendes vê Ouro Preto e escreve a série de poemas intitulada Contemplação de Ouro Preto. Sua visão capta desde as imagens sombrias até as luminosas, vai da morte à vida, do pesado ao leve:
Ruínas de solares e sobrados
Onde pairam espectros de poetas,
De padres doidos, de reformadores
…
O canto alternativo das igrejas
Nos leves sinos da levitação
Cruzando-se em cerrado contraponto,
São Francisco de Assis adverte ao Carmo,
São Francisco de Paula à matriz do Pilar.
(in: Motivos de Ouro Preto)
(...)
Em sua contemplação, Murilo Mendes toca a atmosfera histórica, a religião, a arquitetura, a arte, as figuras e personagens populares e as de renome ligadas à cidade: Aleijadinho, Joaquim José, dona Adelaide…
O passeio do poeta naquela época coincide exatamente com o nosso passeio de agora, quando estamos lá em visita:
Tu, Ouro Preto,
Que outrora foste
E agora inda és.
De qualquer ângulo
Tu sempre és bela!
De qualquer ângulo
Ao olho amante
Sempre és igual.
(in: Romance de Ouro Preto)
(...)
Minha alma sobe ladeiras,
Minha alma desce ladeiras
Com uma candeia na mão,
Procurando nas igrejas
Da cidade e do sertão
O gênio das Minas Gerais
(in: Romance das Igrejas de Minas)
Eu vi a cidade barroca
Vivendo da luz do céu
(in: Flores de Ouro Preto)
Murilo Mendes dedica ao arquiteto Lúcio Costa - que projetou Brasília junto com Niemeyer - um poema sobre a fantástica, singela e belíssima igreja de São Francisco:
Solta, suspensa no espaço,
Clara vitória da forma
E de humana geometria
Inventando um molde abstrato;
Ao mesmo tempo, segura,
Recriada na razão,
Em número, peso, medida
(in: São Francisco de Assis de Ouro Preto)
O poeta fala também das luminárias e da lua, que tanto se destacam ao observador que passeia à noite pela cidade:
Em Ouro Preto
- Viva a sua luz-
Vi luminárias
Dependuradas,
Vi luminárias
Que a mão conduz,
Vi luminárias
Verdes, vermelhas,
Vi luminárias
Roxas, azuis.
(in: Luminárias de Ouro Preto)
No Carmo lua:
Que lua grande,
Corpo estendido,
Lua longueira…
Mas que luarão
Nesses retângulos
Que o Carmo tem!
O Carmo é mesmo
Todo um luar.
(in “A lua de Ouro Preto”)
E afinal, a cidade de Ouro Preto, hoje, é um lugar extremamente acessível e confortável ao viajante. Totalmente equipada com a infraestrutura padrão dos lugares turísticos. Há hotéis, restaurantes, museus, eventos e passeios para todos os públicos.