O meu pai caminhava todas as noites mais de uma légua até chegar em nossa casa. Mesmo porque primeiro ele dava uma subidinha até o sítio do meu avô Victório para saudar sua mãezinha Cecília Maria de Jesus.
Ele ia a ela pedir a sua bênção e, ao receber a bênção da mamãe, ele seguia seu trajeto apesar do cansaço, pois havia trabalhado o dia inteiro capinando com uma enxada em mãos, cortando os matagais que assoreavam a lavoura de arroz.
E à pé meu pai seguia seu caminho, e muito feliz porque havia recebido naquela noite a bênção da mamãe, que para ele era uma coisa sagrada receber as bênçãos de uma mãe. E meu pai voltava para casa deslumbrado.
Meu pai, que para acender o seu cigarro usava o isqueiro assim: um tubo com lã ou algodão, com uma tampinha. E ele trazia no bolso um pedaço de lima e uma pedrinha de cinco centímetros e a lima de uns sete centímetros. E a pedrinha batia na lima fazendo um barulhinho. E quando meu pai se abaixava para pular o fio da cerca de arame, a pedrinha batia no pedaço de lima, e era ali o sinal: papai estava chegando.
Aí então descansava um pouquinho tomando o seu banho. Em seguida assentávamo-nos em volta de uma mesa para as orações e depois, a minha Aninha já com o prato de cada um em mãos... e era assim que vivíamos, minha mãe já nos dava o prato feito.
No ano seguinte meu pai teve uma ideia. Veio cultivar um terreno que ficava ao lado direito do Carreador, bem ao lado de nossa casa, e depois de ter preparado o terreno, ele efetuou o plantio de grãos de arroz.
Só que desta vez não chovia e os pássaros, com fome, e descobrindo os grãos nas covas, se puseram a ciscar com as patinhas para pegar com o bico os grãos e ingeri-los.
Mas meu pai descobriu um espantalho e o colocou no meio da lavoura... e além desse detalhe nos colocou, eu e meu irmão Paulo, para que ficássemos de um lado para outro batendo as tampas de panela para espantar os pássaros até que viesse a chuva.
E, depois que chovesse, meu pai já tinha experiência, e ele sabia que depois da chuva os pássaros não iriam mais invadir os grãos que se encontravam nas covas. Meu pai era experiente no ramo da lavoura!
Odilia Fernandes Avelino é artista do sorrir, da palavra e do encontro, do coser
e do cozer, das linhas e agulhas e das linhas e canetas, paulista brasileira,
filha de índia e mineiro, também italiana de Cândia, Creta.
fotos Walter Antunes